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Writer's pictureGabriel Toueg

A guerra, os fogos e a imprensa

OU: De como é fácil morrer em uma manifestação aparentemente inofensiva


Você já soube. O cinegrafista da Band

Santiago Ilídio Andrade, atingido por um rojão durante um protesto contra o aumento das passagens no Rio na semana passada, teve morte cerebral. A essa altura, os dois responsáveis já estão presos. E Santiago é mais um colega a entrar na já imensa lista de jornalistas mortos, feridos e feitos vítimas em contextos nos quais deveriam apenas fazer a cobertura – segundo o Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ), foram mais de mil mortos desde 1992, 27 deles no Brasil – e Andrade ainda não entrou na lista

Não quero entrar aqui no mérito da culpa dos envolvidos – está claro para mim que levar um artefato explosivo para um protesto é criminoso. Mas deixo essa discussão para os juristas.

Quero comentar outro aspecto dessa questão, algo que esteve bastante na pauta durante as manifestações de junho do ano passado: o papel do jornalista na cobertura de eventos aparentemente inofensivos e o risco a que estamos expostos em situações assim. Você se lembra: no ano passado diversos colegas ficaram feridos – alguns pela polícia, alguns por manifestantes, que também queimaram um veículo de uma TV – durante as manifestações.

Morei durante sete anos no Oriente Médio e em uma ocasião, no verão de 2006, fiz a cobertura da Segunda Guerra do Líbano. Era uma guerra. Em uma ocasião, enquanto conversava com jovens locais sobre o temor de viver tão perto da fronteira em meio a um conflito em que mísseis voam o tempo todo sobre eles, um Katyusha caiu bem perto de nós. Perto o bastante para assustar muito, mas felizmente não tão perto para deixar feridos. Eu não usava, lá, nenhum equipamento de segurança – nem capacete, nem colete. Quando somos frilas, a conta é outra…

Isso tudo aconteceu durante a cobertura de uma guerra. Salvador Andrade morreu durante a cobertura de um protesto. Protestos não são guerras, mas nenhuma manifestação é inofensiva. Nenhum evento pode ser inofensivo quando há, de um lado, manifestantes exaltados (que se dirá dos manifestantes armados?) e, de outro, policiais mal treinados. Daí, meu questionamento: Salvador deveria estar usando equipamento de segurança? Minha tendência é dizer que sim, mas pode parecer que estou atribuindo a “culpa” a ele.

Que fique claro: a culpa não é dele. Se é de alguém “deste lado”, não é dele. O cinegrafista estava lá a trabalho e a responsabilidade pela segurança de jornalistas em exercício deve ser da empresa – da Band, portanto. E a verdade é que a maioria das empresas não cuida de seus profissionais. Não só não há equipamentos (ou quando há são insuficientes) como os jornalistas não são treinados para esse tipo de cobertura – perigosa, arriscada, algumas vezes fatal.

Em tempo: em função da morte de Santiago começou, nas redes sociais, principalmente, uma intensa discussão sobre o termo “terrorismo” para crimes como os dos rapazes que levaram e acionaram o rojão ou como os ativistas do Black Bloc, que promovem quebra-quebra em protestos. Repito o que já disse por lá: essas ações não estão nem perto de terrorismo. Em Israel aprendi que cara tem o terror. Mas é vandalismo e é criminoso – e tem de ser punido como tal.

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