Estive hoje na tenda da família Shalit em Jerusalém, diante da residência oficial do premiê Netanyahu. Este é o local onde os pais do soldado Guilad Shalit, capturado em 2006 pelo Hamas, Noam e Aviva, passam os dias e as noites. No final de junho, eles fizeram uma caminhada de 12 dias entre Mitzpe Hila, onde moram, até Jerusalém. Continuam lá.
Fui para lá porque brasileiros fizeram uma manifestação de apoio à família, enquanto colhiam assinaturas para uma petição que será enviada para o presidente Lula em outubro. No abaixo-assinado, pedem que Brasília interfira e mande um representante para visitar o soldado, incomunicável desde a captura. Publiquei, no Terra: Brasileiros querem ajuda de Lula para libertar soldado israelense.
Não foi a primeira vez que vi Noam e Aviva tão de perto. Lembro de pelo menos outras duas ocasiões recentes. Uma delas foi logo antes do Ramadã, quando o pai de Guilad convocou uma coletiva no hotel American Colony, em Jerusalém oriental, para pedir que os palestinos pressionassem o Hamas como ele faz em Israel, protestando contra Netanyahu, Barak e os deputados daqui. Na ocasião (agosto de 2010), saiu também no Terra o texto Noam Shalit faz apelo ao povo palestino às vésperas do Ramadã.
A segunda vez foi há cerca de três semanas, quando eu estava gravando um programa para a Band e mostrei a tenda da família. Na ocasião, não conversei com Noam, mas ele estava lá, com a mulher, observando de longe enquanto eu falava para a câmera sobre o filho dele, explicava o significado da captura na sociedade, mostrava as fotos penduradas na tenda…
Nas duas ocasiões, e também hoje, ficou a impressão de que, depois de quatro anos, depois de 1.555 dias hoje, eles estão mais do que cansados. Passaram de cidadãos comuns a figurinhas carimbadas na mídia. Deixaram o trabalho e a rotina de gente como a gente para ser “o pai e a mãe do soldado Guilad Shalit”. Passam o tempo indo a reuniões e posando para fotos ao lado de pessoas que eles não conhecem, com meios sorrisos ou sem sorriso algum.
Durante a manifestação, hoje, um ônibus turístico parou na frente da tenda. Umas 40 pessoas desceram, como se estivessem visitando a Times Square em Nova York. Tiraram fotos, voltaram para o ônibus e foram embora. O local, que deveria ser de protesto, virou ponto turístico de Jerusalém.
Quem visita a cidade vai ao Muro das Lamentações, ao Santo Sepulcro, à mesquita Al-Aqsa e dá uma passadinha na tenda dos pais de Guilad Shalit. Depois, dá um pulo na Ben Yehuda, faz compras, passeia pelo Mamila, faz mais compras… Pronto, o roteiro Jerusalém está completo.
Não deveria ser assim. No fundo da tenda, que tem ventilação, comes e bebes leves trazidos por voluntários, muitas fotos de Guilad e da caminhada de 12 dias, frases de protesto, cartazes e fitas amarelas (o símbolo da campanha) amarradas em todos os cantos, os “pais do soldado” observam, sentados em cadeiras de plástico, o vai-e-vem de gente, cansados, sem muita esperança. Tem sido assim desde junho.
Hoje, caminhando à noite pela região, passei de novo na frente da tenda. Os voluntários que se revezam não estavam. O vai-e-vem tinha acabado. Em um canto, ao longo do muro da casa de Netanyahu, meia dúzia de barracas de camping estavam montadas. Tinha chegado ao fim mais um dia dos “pais do soldado Guilad Shalit”. Sem ele.
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